[ Por: Willian von Söhsten * ]
Costumo brincar com meus alunos que há tantos golpes no Jiu-Jitsu que eu poderia escrever folhas e folhas de um caderno apenas com seus nomes. São posições que foram recepcionadas pelo Jiu-Jitsu brasileiro com seus títulos originais como o katagame, nomes americanizados como o armlock ou abrasileirados como a baiana e a americana.
Porém, há golpes que trazem consigo uma história ainda mais interessante, uma ligação com lutadores que, de uma forma ou de outra, causaram boa impressão perante a dinastia Gracie e seus seguidores.
O primeiro é a famosa chave kimura. Conhecida originalmente como ude garami, foi imediatamente rebatizada no Brasil pela família Gracie após a épica luta entre o professor Helio e Masahiko Kimura. O judoca japonês da escola Kodokan era um fenômeno em sua modalidade, sendo considerado o mais jovem godan (quinto dan na faixa-preta) da história daquela arte.
Mundialmente conhecido em uma época que não existia internet, em 1951 veio ao Brasil para enfrentar o mirrado e destemido Helio Gracie. Havia considerável diferença de tamanho, peso e idade entre os dois e mesmo assim o patriarca da família mais famosa das artes marciais brasileiras resistiu por 13 minutos ao chamado “gigante japonês”, antes de sucumbir à eficiente chave de ombro.
Dali em diante, o golpe passou a ser chamado, dentro das academias de Jiu-Jitsu, como kimura, uma alusão a um dos poucos lutadores que conseguiu vencer o pequenino Gracie. (Confira a técnica, a seguir.)
O segundo golpe que lembramos aqui também foi batizado com o nome de um judoca, mas dessa vez um brasileiro. Se numa competição o seu professor disser a você para tentar o sode guruma jime, provavelmente você ficará perdido, sem saber o que fazer. Pois esse é o nome japonês do que aqui conhecemos como estrangulamento ezequiel.
Ezequiel Paraguassu é um grande judoca brasileiro que participou das Olimpíadas de Seul-1988 e Barcelona-1992. Antes de embarcar para os Jogos na Coreia do Sul, o lutador brasileiro decidiu afiar suas técnicas de solo e para isso procurou a academia do grande mestre Carlson Gracie.
Contrariando uma das grandes premissas do Jiu-Jitsu, que diz que o lutador por cima precisa transpassar a guarda do oponente para conseguir a finalização, Ezequiel fez muitas vítimas nos treinos ao aplicar o sode guruma jime de dentro da guarda.
No judô, o golpe não ganhou tanta popularidade pois a restrição de tempo para o combate no solo inibe um pouco a sua aplicação. No Jiu-Jitsu, sem essa problemática, a técnica ganhou força e foi amplamente disseminada. O curioso foi que Ezequiel mudou-se depois de disputar as Olimpíadas para a Suíça, de onde não fazia ideia que seu nome era largamente associado ao golpe nas academias de Jiu-Jitsu do Brasil afora.
Cerca de 19 anos mais tarde, ouviu de um outro professor, durante uma competição, a instrução para que o aluno arrochasse um “ezequiel”. Foi então que aqueles períodos de treino em Copacabana, na rua Figueiredo Magalhães 414, vieram a sua mente. (E você, sabe encaixar o golpe do Sr. Paraguassu? Confira abaixo.)
Por fim, a famosa guarda com gancho De la Riva é um dos grandes marcos do Jiu-Jitsu moderno. Lapidada instintivamente por Ricardo De la Riva, ela ganhou fama após ser usada contra Royler Gracie, até então invicto no peso-pena, durante a Copa Cantão de 1986. Assim como as demais posições, este estilo de guarda já havia sido verificado no judô, mais precisamente o do estilo nonatei.
Assim, Kimura, Ezequiel e De la Riva são nomes que trazem consigo mais do que uma referência técnica, carregam um pouco da boa história do Jiu-Jitsu. E você, amigo leitor, gosta de aplicar algum deles durante o rola? Relembre por fim a guarda De la Riva, e bons treinos!
* Willian von Söhsten é formado em jornalismo e direito, com pós-graduação em semiótica. É faixa-preta de Cícero Costha e professor de Jiu-Jitsu na academia Team Nogueira, em Ribeirão Preto, SP.
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