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Artigo: saiba cuidar do corpo e melhore o rendimento nos campeonatos de Jiu-Jitsu

[ Texto: Rafael Ribeiro* ]

Isaque Bahiense decola após vitória na Copa Pódio, este ano. Foto: Deive Coutinho/Divulgação

É bem comum os lutadores de Jiu-Jitsu saírem das competições com uma cobrança na cabeça: “Preciso treinar mais”. Na vitória ou na derrota, essa é uma sensação muito recorrente ao término dos eventos. Meu objetivo neste artigo é revelar o que há de negativo nesse tipo de pensamento e também apontar sugestões para a fase de “pós-competição”

A competição costuma expor os atletas a uma situação máxima de estresse físico e emocional. Na semana que antecede o torneio, por exemplo, ocorre a famosa “guerra contra a balança”, período em que o atleta tenta alcançar o peso desejado. Muitas vezes, nessa mesma semana, o lutador ainda se submete ao desgaste dos camps, nos quais são realizados treinos puxadíssimos entre os cascas-grossas da academia.

Ambas as estratégias são equivocadas do ponto de vista da alta performance. A semana pré-competitiva deve ser de regeneração e não de desenvolvimento. O atleta deve estar pronto, o que tinha de ser feito já deveria ter sido realizado.

Durante a competição, todos dão o seu máximo para conquistar a medalha de ouro. Há uma depleção de grande parte ou toda a energia do lutador, uma geração de enorme fadiga física, o uso de toda a capacidade de concentração possível. Como se não bastasse, temos ainda as consequências da adrenalina. O resultado disso tudo é uma segunda-feira dolorosa. Eis que, dentro de todo esse contexto, o atleta ainda sai do torneio com a tal vontade de treinar mais.

Trata-se de um desejo que se torna concorrente do estado fisiológico do atleta, concorda?

Fisiologicamente o lutador está em declínio após a competição. Seria um momento propício para restabelecer a condição física e não voltar a uma sessão de treinos desgastantes.

Após a competição é de extrema importância para o atleta oferecer a si mesmo um micro-ciclo (uma semana) de “taper” (regeneração). Nesse período os treinos devem ser mais leves, lúdicos, aquele famoso “soltinho” sem pensar em competição ou mesmo em pontuação.

Fazer liberação miofascial vai ajudar bastante na recuperação. É uma excelente hora para treinar a cabeça. Treinos teóricos de estudo das posições, acertos e falhas técnicas. O treinador/professor deve ter muita conversa com o aluno/atleta. Onde o atleta acertou? Onde errou? O que poderia ter feito diferente? O que pesou ou influenciou no resultado? Com uma análise crítica, o atleta vai saber exatamente o que aconteceu e, assim, vai estar mais preparado para as próximas disputas. A depender da magnitude do evento esse tempo de recuperação pode mudar. Vamos considerar três hipóteses:

1) A competição é pequena e serve como preparação para uma outra.

Neste caso, o treinador deve considerar a competição como se fosse uma ou duas sessões de treino da semana, de acordo com a quantidade de categorias em que o atleta vai competir. Então, inicialmente, não precisa de uma semana inteira de recuperação, mas sim uma modulação da intensidade nos dois dias seguintes ao torneio. Caso tenha algum imprevisto, como lesões, a história muda um pouco.

2) A competição é grande, trata-se do grande alvo no ano (caso do Mundial ou de atletas que se prepararam para um evento de MMA).

Além da semana completa de regeneração, é importante haver o “destreinamento”. Esta fase pode durar até quatro semanas. Se pensarmos em modalidades esportivas como boxe, muay thai ou mesmo MMA, em que existe a possibilidade de nocaute, aí esse tempo pode ainda ser maior.

3) A competição é grande, porém, existem outras na sequência.

Considerando o calendário da IBJJF, isso acontece entre os meses de março e junho, mais precisamente entre o Pan e o Mundial. Nesta fase, temos que manter os atletas no pico da performance por 60 dias. Vou usar um exemplo detalhado do atleta Isaque Bahiense. No último Pan, ele foi medalha de prata, e em duas semanas lutou o Europeu Sem Kimono e o Roma Open, ambos no mesmo final de semana.

Bem, após a campanha brilhante no Pan, Isaque teve uma longa conversa comigo, falamos sobre o que aconteceu no Pan e também sobre o período anterior ao evento. A ideia era analisar se o planejamento havia sido eficiente. E também refletir, desenvolver autoconhecimento, e, claro, desestressar.

Então, na semana posterior ao Pan, dedicamos o treinamento a atividades que oferecessem pleno prazer ao Isaque. Ou melhor, mais “prazer” do que “trabalho”. Fizemos apenas uma sessão de força com intensidade e volumes moderados e com intervalos altos. Afinal, não era um momento adequado para ganhos ou desenvolvimento, mas sim para a manutenção e recuperação, como já expliquei.

Na semana seguinte, Isaque viajou pra a Itália. A mudança de clima e fuso horário também afetam o atleta, e a recomendação nos dois primeiros dias era para ele realizar trabalhos com alto volume (muito tempo), porém, com intensidade leve ou moderada. Assim o cansaço seria adequado para que Isaque conseguisse dormir bem e se recuperasse melhor.

No meio da semana (quarta-feira), invertemos a proporção. Treinos mais curtos e com alta intensidade, todos específicos. Diminuindo gradativamente a quantidade e mantendo a intensidade até chegar o sábado, dia de sua primeira luta.

No fim das contas, portanto, Isaque foi campeão entre os médios do Europeu Sem Kimono 2017 e também no Roma Open 2017, evento em que ainda faturou a prata no absoluto, sempre demonstrando altíssimo rendimento em termos de condicionamento físico.

Claro, existem outras possibilidades para você lidar com o período posterior às competições. Não necessariamente são melhores ou piores, são alternativas. Na minha opinião o modelo apresentado neste artigo vai gerar o melhor rendimento para a grande maioria dos atletas. Converse sobre este tema com o seu treinador e use o conhecimento científico a seu favor. O estudo e o planejamento são de extrema importância e podem fazer a diferença na sua trajetória pelas competições. Oss!

 

*Rafael Ribeiro é preparador esportivo de atletas amadores e profissionais, com foco em MEC (Modalidades Esportivas de Combate) e surf. Ministra cursos de extensão e pós-graduação. Atualmente é responsável pela preparação esportiva dos atletas profissionais de Jiu-Jitsu Michael Langhi e Isaque Bahiense.

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