Deu ontem no jornal “O Globo”, na coluna do bem informado Ancelmo Gois. Em visita ao Rio de Janeiro, o escritor israelense Etgar Keret, que não come carne vermelha desde garoto, derramou elogios aos sushis de nossos restaurantes.
Ele só ficou com uma dúvida. Keret quis saber por que Copacabana tem tanta academia de Jiu-Jitsu. “O motivo é… não sei”, fez graça Ancelmo, usando seu conhecido bordão.
A resposta que Keret não teve provavelmente está ligada, primeiro, às peculiaridades do bairro, desde os anos 1920 uma mistura apaixonante de balneário tropical, com seu Copacabana Palace lembrando a Riviera francesa, cravado a poucos metros da comodidade e do caos de uma metrópole agitada, então capital do Brasil.
Destino natural da nata carioca, Copacabana começou sua relação com o Jiu-Jitsu graças aos laços de admiração e amor de dois irmãos Gracie, cascas-grossíssimas. Carlson, 18 anos mais velho, era o ídolo de Rolls, jovem e também fenomenal. Ao ganhar sua faixa-preta aos 16 anos, no fim dos anos 1960, em plena ditadura brasileira, Rolls já começava a incorporar o que aprendera com o mano Carlson, que por sua vez fora treinado pelo tio Helio. Bom de quedas e criativo no chão, Rolls se transformaria num mito de sua geração, admirado pelos familiares mais velhos e pelos jovens surfistas do Arpoador, na vizinhança.
Carlson e Rolls, de tão próximos, passaram a ensinar no mesmo espaço, em horários ou andares diferentes, no início da década de 1970 até 1982. A troca de informações técnicas que aconteceu sob o teto da academia da rua Figueiredo Magalhães número 414 nessa época é de valor inestimável. Graças à proximidade, era comum o duelo quente entre os alunos mais prestigiados de ambos os professores, que se testavam e dali saíam mais do que preparados para os campeonatos, que se tornavam mais frequentes e ganhavam em importância.
Treinaram por ali monstros consagrados do esporte como Rickson e Royler, Carlinhos e Rilion Gracie, Romero Jacaré, Maurição Gomes, Marcio Macarrão, Peixotinho, Carlos Rosado, Fernando Pinduka, Cassio Cardoso, Osvaldo Alves e Sérgio Penha, entre tantos outros. Muitos passaram a ensinar no bairro, ou formaram alunos que seguiram por lá.
Rolls faleceu em 1982, num acidente de asa delta, e Carlson morreria em 2006. O legado de ambos, porém, segue vivíssimo como a bossa nova, o Copacabana Palace e outros monumentos do bairro que encantou o escritor israelense.