Quando o faixa-preta Ali Magomedov puxou para a guarda, raspou com o auxílio da lapela e por fim finalizou Bruno Frazatto, no último dia 30 de junho no evento ACB em Moscou, muita gente pode ter estranhado. “Ué, um russo cheio de alavanca que vence sem dar uma quedinha?”. Sim, é verdade: o Jiu-Jitsu brasileiro vem colhendo frutos cada vez mais maduros na terra do exímio judoca Vladimir Putin. Mas as sementes foram plantadas há um tempinho.
De fato, na primeira vez em que a equipe GRACIEMAG se aventurou a mapear o Jiu-Jitsu no país da Copa do Mundo 2018, não havia sequer um russo faixa-preta em BJJ por lá.
O ano era 2011, e nosso diretor Luca Atalla desembarcou no aeroporto Domodedovo, para acompanhar um camp organizado pela escola Gracie Barra Moscou no simpático povoado de Chelnavka.
Igor Gracie, o professor escalado para o seminário, viu logo a diferença de culturas quando um faixa-azul para lá de prestativo pediu para rolar com ele. Era o próprio Ali Magomedov, então com 19 anos e estudante de engenharia vindo do Daguestão, cujo pai ambientalista vivera poucas e boas. “Meu pai uma vez foi atacado por um bando de hienas na África, e precisou se defender apenas com uma tocha”.
Valente como o pai, Magomedov pegaria a faixa-preta anos depois, e hoje é um dos principais nomes do kimono na Rússia, junto com feras como Abdurakhman Bilarov e Ayub Magomadov, entre outros competidores de talento.
Logo depois da jornada de GRACIEMAG, a Rússia conheceria o seu primeiro professor na arte suave: o faixa-preta Leonid Gatovskiy, que começara a treinar Jiu-Jitsu na Polônia e terminaria graduado em Nova York, pelas mãos de Renzo Gracie. A história do pioneiro Leonid ilustra bem como o Jiu-Jitsu foi ganhando, aos poucos, força no país.
“Eu praticava uma série de artes marciais, como o Ju-Jitsu tradicional europeu. Certo dia, em 2002, fui à Polônia competir, e ao treinar numa academia de BJJ fui pego num triângulo. Fiquei doido para saber o que era aquilo, que eu nunca tinha visto – aliás, nem eu nem meu mestre.”
Leonid só foi começar a treinar a sério a arte dos Gracie em 2004, viajando sempre que podia, e rolou com vários professores conhecidos dos leitores, como Sergio Benini da GB BH, Alberto Crane e Roger Gracie, até conquistar a faixa-preta em 2011.
Hoje, o Jiu-Jitsu na capital Moscou e nas principais cidades russas ainda não tem o tamanho do hóquei ou do futebol, mas já apresenta números promissores. Fala-se de 6 a 7 mil praticantes de BJJ no país – crianças e adolescentes em sua maioria.
Em 2014, a IBJJF sediou o primeiro Moscou Open no país, com arquibancadas cheias e divisões bem recheadas, em especial nas faixas azul e roxa. Para este ano, há a previsão do primeiro São Petersburgo Open, a ser confirmado em breve pela IBJJF.
Lutador da Alliance em Moscou, Ayub Magomadov estima que já há cerca de 20 faixas-pretas russos ensinando no país, fora os vários brasileiros que chegam.
“Mas não são todos os 20 que competem, então o esporte está apenas começando. Devemos ser uns quatro ou cinco lutando direto”, calcula o faixa-preta de Alexandre “Gigi” Paiva.
Para quem vem de fora, porém, o cenário impressiona. “A estrutura das academias é excelente, e dou seminário para escolas sempre cheias, com mais de cem alunos inscritos”, conta o tricampeão mundial Bráulio Estima, que também esteve presente no último ACBJJ, no dia 30 de junho, em Moscou. “O esporte vem crescendo muito na região, tanto na Rússia como na Chechênia, Daguestão, Ucrânia, Azerbaijão e outras repúblicas próximas.”
Todos os faixas-pretas brasileiros que visitam o país de Oleg Taktarov e Fedor Emelianenko destacam o espírito guerreiro dos russos, uma peculiaridade alimentada por diversas razões.
“Eles têm uma disposição descomunal nos tatames”, repara Bráulio. “Em primeiro lugar, é difícil ver um garoto russo que nunca praticou judô, sambo ou luta olímpica, é como encontrar uma criança que nunca jogou futebol no Brasil. Na cultura de lá, todo rapaz precisa praticar um esporte de combate para ganhar o respeito dos demais. É só olhar as orelhas do povo em geral.”
Outro motivo para a garra russa vem das regras: segundo apurou GRACIEMAG lá em 2011, a maioria das federações de sambo e judô só permite a mudança de faixa e graduação ao praticante que apresenta medalhas; ou seja, é preciso não apenas competir como vencer torneios locais para ganhar a nova faixa.
Numa região do planeta onde saber dar um single-leg é praticamente como fazer embaixadinhas no Brasil, é difícil saber onde os russos vão parar no Jiu-Jitsu. Mas os campeões têm seu palpite: “Eles sabem se movimentar no chão desde garotinhos, são explosivos ao derrubar e detestam perder. Daqui a uns oito a dez anos, quem vai segurar esses monstros?”, pergunta-se Bráulio Estima.
ACB JJ 14
Moscou, Rússia
30 de junho de 2018
Lucas Lepri venceu Davi Ramos por pontos
João Miyao venceu Ary Farias por pontos
Luiz Panza finalizou Rodrigo Cavaca nomata-leão
João Gabriel Rocha venceu Nicholas Meregali por pontos
Igor Silva venceu Abdurakhman Bilarov por pontos
Lucas Hulk venceu Romulo Barral por pontos
Lucas Rocha finalizou Daud Adaev no armlock
Thiago Sá finalizou Ayub Magomadov na chave de pé
Ali Magomedov finalizou Bruno Frazatto na chave de pé
Gabriel Marangoni venceu Osvaldo Queixinho por pontos
Gabriel Lucas e Marcos Santa Cruz foram desclassificados por amarração
Rodnei Barbosa venceu Samir Chantre por pontos
Veja Leonid enfrentando o hoje campeão do UFC Khabib Nurmagomedov
Khabib Nurmagomedov vs Leonid-Gatovskiy from David Grappler Bista on Vimeo.
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